A época dificil que atravessamos, deve obrigar, mais do que nunca, o amador a pensar reflectidamente nos seus deveres e responsabilidades. Não podemos imaginar, pelo facto de possuirmos indicativo e licença para emitir, que nos foram conferidos todos os direitos possíveis e imagináveis. Se pagamos, com pontualidade a nossa taxa ao Estado, não quer dizer que adquirimos o privilégio de abusar do éther... Aos direitos que nos são reconhecidos correspondem deveres, que garantem esse reconhecimento. O Estado, que tem o privilégio das comunicações cedeu-nos uma parcela da sua soberania, na certeza que usaremos dela segundo as normas estabelecidas no Estatuto do Radioelectricidade. As nossas estações, que são postos de amador e que apenas podem realizar comunicações de natureza bem definida, não são estações telégrafo-postais, nem cabinas telefónicas. Não são pequenos postos de radiodifusão, nem estações comerciais de rádio. Pensar o contrário ou agir, esquecendo estes princípios, é caminhar para as maiores dificuldades, não somente prejudicando o nosso posto, como, também, todos os amadores. O conceito público acerca do amador forma-se pela escuta das nossas comunicações. Assim se avalia o grau da nossa disciplina, o valor da nossa técnica. Por este modo se forma uma opinião acerca da nossa utilidade. O amador tem, portanto, de ser cauteloso na sua técnica, conseguindo que o seu emissor marque pela sua afinação cuidada. Tem de ser cauteloso no seu modo de trabalhar, seguindo os preceitos em uso universal, sem fantasias prejudiciais. Tem de ser cauteloso na sua linguagem de forma a manter os créditos do amador, tantas vezes digno das mais altas distinções. Para merecer a concessão, que lhe foi dada pelo Estado, o amador tem de ser patriota. Não se pede, evidentemente, a todos para ingressarem nas organizações especiais, previstas como elementos de defesa da integridade nacional. Essas adesões têm de ser voluntárias, nunca forçadas. Mas deve-se reconhecer ao Estado o legítimo direito de defesa, averiguando se realmente somos dignos de utilizar a concessão valiosa que nos foi dada. Nenhum amador deixará de concorrer para que a opinião, que possam ter a nosso respeito as entidades oficiais, seja aquela que se possa formar acerca de um corpo disciplinado, conhecedor dos seus deveres e cumpridor das suas obrigações. Antes de falar ao microfone ou antes de pegar no manipulador nenhum amador deve deixar de pensar, que uma acção irreflectida pode comprometer todos os seus colegas, prejudicar todos os seus amigos, inutilizar o futuro do amadorismo português. Parece, também, que haveria vantagem em ocuparmos, quanto antes, com maior intensidade as zonas que nos foram distribuídas. As frequências de amador devem ser, também, criteriosamente utilizadas. Teimar em usar para comunicações locais frequências impróprias e causar um qrm inútil, que a ninguém aproveita. Que ao menos nos aproveite a noção que as frequências usadas para as comunicações locais são muito mais económicas em material e aparelhagem e estaremos cumprindo a nossa missão de amadores. Não é, portanto, tão simples quanto parece ser amador, na verdadeira significação da palavra, - exige critério e reflexão. Ouso pensar que ninguém deixará de ter essas qualidades se quiser, sem risco, usar um indicativo.
José Penha Garcia, CT1BY
Presidente da R.E.P.
Transcrito do Boletim n.º 35, de Março de 1937.
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